> Descalços
Texto: Caroline
Craveiro
Fotos: Marcelo
Terça-Nada!
Pistas
Pista 1
Percurso
Identidade
Rastro Tempo
Trajeto 3.5.2000
Pista
2
4.5.2000
Pista
3
5.5.2000
Pista 4
7.5.2000
Pista 5
8.5.2000
Pista
6
9.5.2000
Pista
7
10.5.2000
Pista
8
10.5.2000
Caixas
Pista
9
11.5.2000
Pista
10
11.5.2000
Pista 11
12.5.2000
Pista
12
13.5.2000
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Tendo
como tema A Escultura e o Passante e considerando o fato de que
a personalidade de cada cidade é adquirida através das pessoas
que nela habitam e do modo como estas pessoas vivenciam o cotidiano
de suas esquinas, praças, viadutos, ruas e edifícios, podemos
buscar na cidade os símbolos que povoam o imaginário de seus
cidadãos, assim como buscar nos cidadãos estes símbolos - referências
de seu tempo, de seu lugar, de sua vida. A obra "Descalços" compartilha
desta busca, uma vez que traduz o cotidiano das passagens, das
travessias, dos passantes...
"Descalços" foi
um dos três projetos selecionados para a fase final do concurso
de arte pública "A Escultura
e o Passante".
Esteve instalado entre os dias 15 e 30 de Maio de 2000 no canteiro central da
Av. Álvares Cabral em frente a Rua Matias Cardoso - Praça da Assembléia,
em Belo Horizonte, MG - Brasil. Esse site foi feito para compartilhar
as propostas, experiências e questões do projeto.
Equipe:
Caroline Craveiro (geógrafa), Ângela Cristina Marques (jornalista),
Marcelo Terça-Nada! (artista plástico), Ricardo Sousa (artista
plástico, cineasta), Daniel Poeira (artista plástico, cineasta),
Mário Emmanuel (geógrafo), José Adélio (artista plástico).
Agradecimentos:
Fabrício Fernandino, Liliza Mendes, Seu Marcos e Ênio (da Fundição
do Russo), Tarcísio, Cléber Falieri, Lísia Maria, Ana Vladia
e Paulinho Marques (da Fundição Artística Paulo Marques), Alexandre
(da Casa da Resina), Lícia Cléa Veiga, Mariana Prandini, Augusto
Freitas e a todos os amigos que doaram sapatos para o projeto.
Todo
o processo de criação no site: http://passantes.vilabol.uol.com.br/
Sapatos
seguem um porquê ... outros, desviam-se pelo caminho... seja passeando,
marchando, correndo ou quase flutuando, são formas passantes que
imprimem no espaço algum sentido...
As formas que dão corpo à passagem, o que, então, poderão provocar nos
atores desta construção-espaço?
Estão os sapatos a simbolizar estes passantes ... São os transeuntes,
homens, mulheres e crianças; aquele que está à deriva; o perdido na multidão; o
flâneur ...
Os sapatos traduzem a impressão da passagem, os passos que inventam fronteiras
e demarcam a cidade.
E se "Descalços" dá corpo à passagem, aos passantes valores,
sentimentos, tradições e vontades, também dá corpo aos pés descalços:
pela fuga, pela pressa...
Os
sapatos de "Descalços" poderiam ser aqueles que saltam
dentro de poemas de Baudelaire... tropeçando em palavras como
nas calçadas... como também os sapatos esquecidos pelas Cinderelas
que, sem hora marcada, foram também esquecidas pelas esquinas.
Aquele
que passa imprime sua marca no espaço de percurso, de trânsito,
de fluência do movimento urbano. Mas, ao mesmo tempo, o passante
carrega algo dos espaços percorridos. Se a cidade pode ser lida
como um livro aberto e mutante, ela imprime sua marca naqueles
que são seus leitores. A leitura deste espaço urbano, exige que
as pessoas se desloquem inteiras. Não é só o olhar que trabalha,
todos os sentidos estão envolvidos, todos são chamados a "sentir" a
cidade, a descobri-la. E nada melhor que o ato de caminhar para
desvendar os símbolos e traços que caracterizam a cidade e seus
habitantes. Percorrer a cidade se tornou sinônimo de ler a cidade,
em suas múltiplas facetas, complexidades e transitoriedades.
Assim, podemos dizer que ir = ler. O caminhante é um leitor do
espaço.
A
cidade imprime sua marca em nosso corpo, principalmente, através
de nosso vestuário. O espaço em que vivemos exige que nos apresentemos
aos outros de forma que exista uma identificação imediata,
algo que mostre aos outros nossa identidade. As roupas são índices
de nossa origem, do lugar social do qual fazemos parte.
Pés
descalços andando em meio a uma multidão de calçados constitui-se
num elemento dissonante. Ficamos vulneráveis descalços. Hesitamos
no andar, desviamos de poças, pedras, cacos de vidro, pontas
de cigarro, pregos. Quando descalços prestamos maior atenção
ao espaço percorrido por nossos pés, ficamos atentos ao trajeto,
percebemos melhor, detalhes que os sapatos ignoram. A planta
dos pés reconhece a planta da cidade.
O
sapato é a marca registrada de seu dono. Adapta-se à forma do
pé de quem o usa. Adquire qualidades do dono. Acaba se transformando
num signo de identidade. Os sapatos acompanham os destinos dos
pés, seja passeando, marchando, correndo ou quase flutuando.
Dizem quem somos nós, por onde andamos, que pistas e rastros
deixamos para trás. Os sapatos simbolizam os passantes, os atores
do espaço urbano.
Esses
objetos pretenderam alguma permanência num lugar que é naturalmente
de passagem, todos tinham marcas de mãos atuantes e/ou memórias
de caminhos: eram sapatos já bem usados ou feitos especialmente
para serem deixados naquele movimentado canteiro central. Traziam
em si uma história: um poema, um bilhete, fragmentos, interrogações.
Objetos lançados no meio do cotidiano, pretenderam provocar acasos,
encontros, instigar as pessoas que ali passavam, anunciar.
"De
quem são os sapatos que achamos jogados pelas ruas
ou dependurados nos fios de luz?"
muitas
ruas passam por mim
mas nunca chegam
ao meu fim
O
Passante e a moça que o observa da janela...
Onde
piso deixo minha pegada
que marcas levo de onde eu piso?
Será que
engatinhávamos com tanta pressa?
As
rugas em minha pele não são tempo: são estrada
Quem é você?
Por onde anda?
Os
pés que me calçavam
agora estão descalços
Paz
os caminhos estão descansando...
"Mis
zapatos siempre combinan
con mi cartera, que combina con
mis aretes y con el color de mi
cabello."
"Vagar
pela cidade e clicar em sites na internet é escrever, deixar
marcas,
imprimir nosso traço no espaço cotidiano."
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