Em português, a palavra "história" tem
um duplo significado. Significa história enquanto modo
de organizar factos e eventos passados de forma progressiva,
e significa história enquanto narrativa ficcional ou
não ficcional. O meu projecto "uma história" baseia-se
neste duplo significado.
Fui convidada para uma exposição colectiva que
comemorava o 5 de Outubro de 1910. Neste dia um golpe de estado
republicano depôs um regime monárquico com 771
anos. O comissário, pensando na performance A Bedtime
Story, perguntou-me se quereria fazer uma nova versão
da mesma. Curiosamente alguns meses antes tinha pesquisado
sobre o período revolucionário para a instalação
Símbolo.
No dia 4 de Outubro de 2008, abriu a exposição
no Palácio de Belém, e à entrada todas
as pessoas recebiam um flyer sobre "uma história".
Eu tinha construído um blog para o projecto que esteve
em actualização durante todo o tempo da exposição.
No blog as pessoas podiam consultar as horas reservadas, aceder
a links relacionados com o projecto (incluindo o repertório
de textos) ou ler as instruções da performance.
Os textos que escolhi não eram comemorativos da história
oficial Portuguesa. Os textos escolhidos são de historiadores
e investigadores que desvelam um outro lado da História,
um lado que tinha sido apagado e esquecido. Nunca ouvimos sobre
ele na escola.
Antes de cada performance eu escolhia o texto para ler
baseada no conhecimento prévio que tinha da pessoa, ou no que
intuía pelos emails trocados aquando da marcação.
Quase todas as performances foram apenas para uma pessoas,
no entanto houve pessoas que pediram para ouvirem a sua história
com o(a) companheiro(a), um familiar, ou um amigo chegado.
Uma das vezes houve mesmo um pequeno grupo: um artista, a sua
mulher, o filho de ambos, e um amigo.
Eu começava sempre por uma conversa introdutória,
para assegurar que as pessoas tinham conhecimento das instruções
e se estavam confortáveis. Depois lia o texto escolhido.
Em geral fazia pausas na leitura para adicionar comentários
pessoais ou pequenas notas, e também ia decidindo na
altura que excertos leria ou evitaria. Quase todas as vezes
a leitura era interrompida mutuamente pela conversa que se
ia estabelecendo, comentários que se introduziam, ou
troca de experiências comuns - especialmente porque as
histórias orais sobre essa época ainda correm
em muitas famílias. E se não houvesse nenhuma
outra performance a seguir a conversa continuava...
A performance estabelecia um tempo e um lugar para uma
experiência íntima,
que era simultaneamente uma aproximação crítica
a um passado comum e uma ligação entre pessoas
através da nossa memória e sobre quem somos hoje.